28/01/2016

"Harry Potter e o prisioneiro de Azkaban" - diário de leitura

Em julho do ano passado, comecei a leitura da série Harry Potter. Estou lendo na medida do possível, porque outras leituras se intercalam, seja por vontade, seja por obrigação. Logo em seguida, assisto ao filme correspondente, o que tem sido uma experiência interessante. Com a memória fresca sobre a trama literária, tenho condições de notar as soluções encontradas para transpor a narrativa de uma linguagem para outra, com condensações, com supressões e com outros recursos de adaptação. Também é divertido comparar o que imaginei dos ambientes e das personagens descritas em linguagem verbal com o que foi criado e reproduzido em imagem pela equipe de produção cinematográfica. No geral, tenho achado muito boas as soluções.


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Neste final de janeiro, adentrei as páginas do terceiro volume da séria, Harry Potter and the prisoner of Azkaban. A fórmula é a mesma: início com os sofrimentos de Harry junto à família de trouxas que o criam e a ansiedade pelo retorno a Hogwarts, geralmente com a intercorrência de algo que ameace essa volta; compra de material escolar e reencontro com Ron e Hermione, os dois amigos próximos; paulatina apresentação do vilão da vez, a figura cuja identidade e cujos métodos vão sendo revelados aos poucos, tanto para leitoras como para as personagens principais. Pelo menos, é assim que ocorre nos três primeiros livros com os quais já travei contato. Não fosse a criatividade de Rowling para engendrar e caracterizar bem um mundo próprio, a fórmula apresentada seria bem cansativa. 
Entre os exemplos de invenções instigantes da autora, estão os livros didáticos indicados por Hagrid em seu primeiro ano como professor, oportunidade surgida para ele após Harry e seus amigos terem esclarecido, no livro 2, um episódio do passado de Hagrid que motivara a expulsão deste da escola. São livros sobre como cuidar de criaturas mágicas. Na livraria, os exemplares ficam engaiolados, em luta selvagem entre si, e os livreiros precisam usar luva e uma espécie de pinça grande para entregá-los aos consumidores. O livreiro fica bastante aliviado, quando Harry avisa que já possui um exemplar, porque não precisará enfrentar a fúria dos livros animalescos.


Neste terceiro volume da série, outra situação que me pareceu muito criativa foi a primeira aula com a Professora Trelawney, de artes adivinhatórias. É cômico uma professora desse tipo de matéria apresentando o programa de aulas para o ano à frente, porque ela prevê, por exemplo, que as aulas serão interrompidas em fevereiro, em virtude de um surto de gripe que afetará, inclusive, sua voz. A autora aproveita essa circunstância especial da personagem para inflamar o suspense que, pelo menos até este livro, é sempre criado: displicente, como mais um ponto do calendário letivo, a professora dispara que, infelizmente, alguém dali deixará o grupo para sempre.
Por ora, é isso. Volto depois com mais impressões dessa leitura, caso me sinta motivado a tal. Alguém que já tenha lido toda a série tem um predileto entre os livros?

18/01/2016

Aniversário do "Palavra de Literatura"

O blogueiro voltando ao trabalho, depois de quase um mês de folga.

Estou de volta a Brasília, depois das férias na Paraíba. Ontem o Palavra de Literatura completou um ano de existência. Em 17 de janeiro de 2015, saiu a primeira postagem no blog, dias depois de iniciado o perfil no Instagram. Acabei de reler o primeiro texto publicado aqui e os comentários de primeira hora, muito simpáticos, incentivadores, pelos quais agradeço. Tratava-se de uma espécie de programa de intenções, em que eu divisava o que seria o objetivo do blog.

Passado o primeiro ano, a impressão que tenho é de que o blog desviou-se um tanto do projeto inicial. A ideia primordial de colecionar palavras insólitas encontradas nas leituras ficou em segundo plano, e as publicações assumiram feições de resenha e de diário pessoal. Parte da meta também era fazer registros de meu ano, comprometer-me a escrever, a praticar o gesto de alinhavar momentos e lampejos em palavras escritas. Isso foi obtido em 88 postagens de tamanho e de teor variáveis. 

A experiência de acumular textos de autoria própria e retornar a eles sempre me foi muito instrutiva. Ensina sobre o tempo dentro da gente: o que de nós muda e o que permanece. Interessantíssimo também é voltar a algo que se fez e não se reconhecer, surpreender-se com o fato de que aquilo lhe saiu da mente e, no jeito de escrever mais atual, da ponta dos dedos. Vislumbrar o estranho que nos habitou, ou sentir-se um estranho dentro daquele que somos, é, entre outros ensinamentos, uma lição de alteridade, de que o mundo tanto precisa, e eu também.

Em 2016, continuo por aqui. Gostaria de retomar mais postagens com as palavras insólitas, que, como mencionado na inauguração do blog:

expressam situações, sentimentos, conceitos, objetos, colecionar palavras raras é uma maneira de, ao mesmo tempo, coletar e desencavar situações insólitas, sentimentos muliados, conceitos heteróclitos, objetos desvezados. É um jeito de enriquecer nossa experiência do mundo.

Por outro lado, como o Palavra de Literatura é muito exercício de liberdade, experimento e lazer para mim, não me preocupo em ater-me demais a amarras. Já sou muito contido na vida real, mais do que aqui, e estou procurando reequilibrar isso lá também. Continuarei a fazer registros, pretendo compartilhar a experiência do Mestrado em Literatura, agora como aluno efetivo, e seguirei com os trechos, com as resenhas e com os diários de leitura dos livros que ler. Aqui e ali, deve aparecer comentário sobre filme.

No final das contas, escrevo para mim mesmo em primeiro lugar, porque leitores mal aparecem por estas plagas, muito menos que se manifestem. Os que estão aí do outro lado me são muito caros, e eu adoraria receber notícias, seja por comentários, seja por e-mail: palavradeliteratura@hotmail.com.

13/01/2016

Livraria do Luiz

Ontem visitei a Livraria do Luiz, e foi uma redenção. Buscava livros de autores paraibanos, e o melhor lugar para garimpá-los atualmente, na capital do Estado, é lá. O atendimento está diligente, pode-se tomar um espresso São Braz enquanto se folheiam os livros pré-selecionados, e o ambiente parece bem apresentável. Antes ou depois de cavoucar estantes, tem-se a oportunidade de circular pelas calçadas do Centro, de rever as fachadas do Palácio da Redenção, da faculdade de Direito, do Tribunal de Justiça e a mais moderna da Assembleia. Ir lá é também uma forma de homenagear a memória de Augusto dos Anjos, cujo busto preside à entrada da galeria que leva seu nome e abriga a livraria.

Palácio da Redenção e parte da fachada da faculdade de Direito vistos da Praça João Pessoa.



O beijo de Maria José Limeira

Senhoras e senhores, continuo de férias na Paraíba, minha terra natal. Ontem, terça-feira, fui ao Centro e fiz uma farra bibliófila. Limpei parte das estantes de meu antigo quarto, onde restaram muitos livros que não era prioridade levar para Brasília, e troquei, no Sebo Cultural, por obras de autores paraibanos. Depois passei na tradicionalíssima Livraria do Luiz, loja de rua, fora de Shopping Center, felizmente revitalizada, aparentemente salva da falência para a qual demonstrava caminhar, e comprei outros livros de autores conterrâneos.  Como as produções regionais quase não circulam nas livrarias de Brasília, priorizei essas compras.
Adquiri três livros de Maria José Limeira, que era prima legítima de meu avô materno. Aqui na Paraíba, primo legítimo não se contrapõe a bastardo ou ilegítimo, como alguns amigos pensam ao ouvir o termo, de chofre, em Brasília. É o primo-irmão do Rio de Janeiro, o primo básico. Zezé Limeira tem uma obra interessantíssima, de grande qualidade, tanto em prosa quanto em poesia. Ela enfia a faca nas vísceras da gente.
Estava aqui, madrugada à solta, folheando o Crônicas do amanhecer, da citada autora, e deparei com um texto sobre o beijo, "Beijar é bom e eu gosto". É um dos muitos textos em prosa poética de Maria José Limeira. Começa assim: "Eu quero agarrar o instante, quando o beijo nos reuniu, e você fala em adeus".
Vocês, que não me leem, guardam a lembrança de algum beijo-síntese? Algum beijo, por exemplo, represado até o último instante contra uma vontade avassaladora de beijar, até que o beijo aconteceu como o rompimento da barragem em Mariana e deixou um rastro de destruição que, segundo as projeções, deve imprimir danos de décadas por onde se alastrou?
A boa literatura faz isso com a gente.

07/01/2016

Balanço de 2015: os livros com nota máxima

Uma vantagem que aplicativos como o Goodreads e o Skoob oferecem a seus usuários leitores, além da interação ao estilo de rede social com outras pessoas, é a possibilidade de organizar e de registrar as leituras, de maneira que o usuário possa refletir sobre elas. Estava vendo há pouco meu balanço de livros lidos em 2015 e pude verificar quantos receberam cinco, quatro, três ou duas estrelas em minha avaliação, por exemplo. Noto que um ou outro mexeu comigo em retrospectiva, passados meses do término da leitura, como não pareceu me mover imediatamente após consumida a última página. Visualizando o conjunto de obras por avaliação dada por mim, ocorreu-me que talvez mudasse o arranjo e melhorasse algumas, ou rebaixasse outras.
Quando li Barba ensopada de sangue, em 2014, embora gostasse demais da companhia do narrador criado por Daniel Galera, a ponto de atravessar o livro a goles generosos e sôfregos, não achei que merecesse cinco estrelas. Lembro que considerei Dois irmãos, lido imediatamente antes, mais merecedor dessa avaliação. Tempos depois, sinto muita vontade de voltar ao Barba, uma saudade daquele ritmo, daquelas personagens, da ambiência, do constante sentimento de estranhamento que perpassa todo o livro, mas não sei que relerei o romance de Hatoum que lhe pareceu superior.
Esse exercício de reflexão proporcionado pelo registro e pela avaliação das leituras de um período mostra como a recepção de uma obra ficcional oscila na gente. A partir dessa constatação, pode-se questionar o que determina a variação de percepção. A gente pode ter mudado, depois de um ano, e o que pareciam critérios importantes, ao avaliar o livro logo após lê-lo, esmaece, perde valor.  O próprio livro recém-lido tem potencial de mudar a gente no sentido de seus valores e de sua coerência própria, mas a transformação não se dá logo em seguida à leitura: pode reverberar no leitor ainda algum tempo, inclusive imperceptivelmente.
Dos 35 livros que li em 2015, atribuí cinco estrelas a 13, os seguintes, sem hierarquia entre eles:

Ficção

1. Viva o povo brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro
2. O evangelho segundo Jesus Cristo, de José Saramago
3. Memorial de Aires, de Machado de Assis
4. Harry Potter e a pedra filosofal, de J.K. Rowling
5. O amanuense Belmiro, de Cyro dos Anjos
6. Bartleby, the scrivener, de Herman Melville
7. O livro das mil e uma noites, v. 1 - Ramo sírio, traduzido por Mamede Mustafa Jarouche


Não-ficção

1. Jung: o mapa da alma, de Murray Stein
2. O Anjo Pornográfico, de Ruy Castro
3. História da morte no Ocidente, de Philippe Ariès
4. A menina sem estrela, de Nelson Rodrigues
5. Teoria das Relações Internacionais, de João Pontes Nogueira e de Nizar Mesari
6. 18 dias, de Matias Spektor